terça-feira, 17 de abril de 2012


                                  PAIS MODERNOS PARA FILHOS NEM TANTO
Esqueça aquela ideia de família perfeita, que não briga. A vida doméstica é boa parte do tempo ocupada pela resolução de conflitos. Gerações distintas dividindo praticamente o mesmo espaço físico (cada vez mais exíguo) é garantia de choque de opiniões e de conceitos.
É claro que a atual safra de pais de adolescentes, hoje entre 35 e 50 anos, é mais aberta à discussão de temas espinhosos e mais hábil para lidar com tabus. Em teoria, lidam melhor com temas como camisinha, deslizes esporádicos com bebida, eventuais experiências com drogas ilícitas e namorados ou namoradas dormindo em casa. Com pais assim, poderia se imaginar que as discussões e as brigas seriam varridas. Mas não.
Primeiro porque bom preparo não é garantia de bom desempenho na hora que o calo aperta. Nesse momento, toda teoria pode ir para o lixo. Depois, porque alguém esqueceu de contar aos filhos que eles também deveriam ter um comportamento adequado aos novos tempos. Eles mantêm traços característicos das gerações passadas de adolescentes. Protestam, querem mais liberdade , vestem roupas “estranhas”, adotam cortes peculiares de cabelo e ornamentam o corpo com tatuagens e piercings. Já viu esse filme antes?

A novidade dessa geração de adolescentes talvez seja a dificuldade em lidar com os limites e concentrar sua atenção nos mais diversos campos de sua vida. Quase 25% deles fazem parte de famílias reorganizadas (em que os pais originais não estão ou nunca estiveram juntos). Em mais de 70% dos lares, a mãe saiu cedo de casa para trabalhar. As crianças vão para escolinhas e ficam sob o cuidado de terceiros mais precocemente. Os pais carregam a culpa ancestral de ficar pouco com os filhotes. Quando ficam, não conseguem dizer “não”. Resultado: ficou mais difícil impor limites. No mundo virtual, está fácil navegar sem restrições e difícil se concentrar num objetivo. Os pais não sabem se delegam para a escola (que já reclama da sobrecarga de responsabilidades) ou se terceirizam a resolução dos problemas para os terapeutas. No baile dos perdidos, os conflitos geracionais ganham escala.
Mas surge um alento. Numa pesquisa que fizemos em parceria com um portal de educação há alguns anos, com quase 9 mil alunos de 13 a 17 anos de escolas particulares de todo o país, a família aparecia como o grande centro de atenção dos filhos. Questionados sobre que tipo de pais seriam, os jovens disseram que dariam mais liberdade e conversariam mais com os filhos. Mas admitiram que gostariam de seguir o modelo dos pais que têm em casa. Curioso, não? Será que, no fundo, com um ajuste aqui e outro ali, não estamos fazendo a coisa certa?
(AUTOR: JAIRO BOUER é médico formado pela USP, com residência em psiquiatria. Trabalha com comunicação e saúde. E-mail: jbouer@edglobo.com.br)